Quando as horas de sono são menos do que as necessárias, até o simples e rotineiro processo de ajeitar o sofá, para aquilo que será uma tarde com ócio a perder de vista, se pode transformar - ainda que por breves segundos - na convicção de que estamos a experienciar um fenómeno paranormal, ali, no meio da nossa própria sala, sem que ninguém nos possa acudir. O cérebro cansado bloqueia no meio daquela gritaria infernal que parece vir da televisão. Sim, é ela que grita! Ufaaa, não são as forças o mal! Volume?! Comando?! Onde está?! Rápido! A mão direita, a única disponível no momento, revolve as mantas e almofadas que cobrem o sofá. Nada! O volume não pára de aumentar. O cérebro cansado, e agora violentado pelo berreiro, volta a equacionar a hipótese de uma televisão possuída. Não tardaria muito para que jorrasse água e cuspisse uma criança enlameada, com os compridos cabelos negros molhados a esconder-lhe a cara. Eu, de costas para a televisão, com a mão direita ainda a procurar o comando, soterrado naquelas mantas displicentes, seria sugada a qualquer momento para dentro do aparelho... No meio do pânico, a mão direita desiste do sofá, vai à mão esquerda e dá de caras (neste caso, de mãos) com o comando da televisão - entalado entre As Intermitências da Morte e o telemóvel. Estrafeguei o botão do volume em decrescente, continuando de costas para a televisão, na esperança de que o mesmo funcionasse, também, como um mecanismo de repatriação da tal criatura (cuja mão estaria já muito próxima da minha nuca) para dentro do aparelho. Findo o processo, enfrentei o mesmo e, sim, tudo voltou ao normal.
Bahhhh.....