domingo, 14 de novembro de 2010

Complicações da vida, em espiral

Aos 6
Descobri que varrer o cocó do cão, ao longo da carpete da sala, não era a melhor forma de impedir que a minha mãe soubesse que ele tinha estado lá.
Aos 7
Os ensinamentos da catequese levaram-me a pensar que, se continuasse a esconder, na garagem, as coisas que partia, tinha fortes probabilidades de acabar esturricada no fogo do Inferno.
Aos 8
Percebi que precisava de uma nova estratégia para os rapazes me deixarem jogar à bola – bater-lhes desgastava-me fisicamente e diminuía o meu rendimento no jogo.
Aos 9
Percebi que a garagem não era um bom esconderijo para os despojos da minha traquinice e ficar uns dias sem televisão era o meu Inferno cá neste mundo.
Aos 10
A minha mãe explicou-me para que servia um penso higiénico e eu fiquei preocupada porque pensei que ela estava a enlouquecer.
Aos 11
Fiz uma birra para comprar uma K7 dos Modern Talking e percebi (da pior forma) que reconhecer a fronha dos artistas na capa não era informação suficiente para comprar a K7 certa.
Aos 12
Um rapaz mais velho perguntou-me se eu queria “andar” com ele e eu disse-lhe que ia pensar por que não percebi onde ele queria ir.
Aos 13
Uma amiga mais velha explicou-me como se usava um tampão e quando mo mostrou (tampão e aplicador) eu soube, logo ali, que ela tinha enlouquecido.
Aos 14
Senti na pele as agruras da globalização – o meu irmão descobriu o Wrestling e eu fiz uma entorse num tornozelo, a fugir do Undertaker.
Aos 15
Percebi que folhear uma revista enquanto a cabeleireira nos corta o cabelo, pode ser sinónimo de pedir um corte escadeado e sair de lá com uma espécie de “capacete” até aos ombros.
Aos 16
A globalização continuava a fazer-me das suas - ir à mercearia da “santa terrinha” com uma bandana no pulso e pin’s dos Nirvana, no casaco de ganga, era sinónimo de consumir drogas (e foi complicado convencer a minha mãe do contrário).
Aos 17
Percebi que se não queria que a minha mãe soubesse que eu tinha namorado, o melhor era escolher um sem barba – sempre tive uma pele muito sensível.
Aos 18
Percebi que a quantidade de rapazes que me achava simpática era proporcionalmente inversa ao tamanho dos meus calções ou da minha mini-saia mas, agora, não seria de bom-tom bater-lhes.

E se a falha de memória não fosse uma das complicações actuais, isto continuava por aqui fora até vocês estarem com um tédio descomunal entranhado nesses ossos (partindo do princípio que tinham pachorra para chegar até aqui, claro!). Se eu não me esquecer de tomar as vitaminas para o cérebro, isto há-de ter continuação, mas talvez com um título diferente… qualquer coisa do género “Complicações minhas, em espiral” – a inocência dos early years perde-se e a nossa capacidade para complicar as coisas apruma-se.
Agora sim, compreendo o que Jean-Jacques Rousseau queria dizer com aquilo dos homens bons e da sociedade.

[Que belos 6 anos foram aqueles!]

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