sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

O Natal visto…

Pelo Menino Jesus: A globalização venceu-me! Desde que aquele gordo vestido de vermelho apareceu, a minha vida nunca mais foi a mesma. Sem qualquer fonte de rendimento, se não fosse o Banco Alimentar Contra a Fome, o meu Natal seria bem pior! Direitos da Criança, does that ring a bell? Ai e tal as crianças não podem ser vítimas de trabalho infantil. E comida? Como é que eu me sustento sem o meu ganha-pão? Não percebo nada de computadores, arranho mal o Inglês… querem o quê? Que vá para as Novas Oportunidades? E o que é que eu vou pra lá contar da minha história de vida que o mundo não saiba já?

Pelo Pai Natal: Esta época alta mata-me. Mas que raio de emprego fui eu roubar aquele puto de vestido branco! Como é que ele aguentava distribuir esta tralha toda só com um burro velho e teimoso! Tenho que deixar de beber Coca-Cola que, com esta pança (que é só retenção de líquidos… e gases!), qualquer dia não subo o trenó! E com esta idade, e esta imagem gasta, vou fazer o quê? O melhor é enviar já um currículo para a TVI, que lá para Fevereiro já tenho um talk show em horário nobre. Volta Menino! O Tio Claus está cansado.

Pelo Rodolfo: Este velho está cada vez mais pesado. Credo que se não fazes uma dieta, eu peço já a reforma antecipada e quero lá saber da penalização. Ai e tal os direitos dos animais… Cadê! Não me basta ter cornos, carago!

Pela Virgem Maria: Horas de parto difícil pra carago, numa gruta fria e escura, e o que esta gente se lembra no Natal é de saldos na Zara e de peru assado na mesa. Querem ver que tenho de me pôr em cima de uma oliveira, outra vez, assim só naquela de meter um bocado de respeito a esta gente mal agradecida?!

Por S. José: E eu? Tive de assistir aquele parto dificílimo na gruta (e o puto nem sequer era meu), arranjar uma parteira no meio do nada, tive uma capacidade de resposta fantástica (num momento de tão grande aflição), facilmente comprovada por aquela manjedoura de vacas que, tchan ran, se transformou num berço, com colchão de palhinhas fofinhas (momento que, dois mil anos mais tarde, viria a dar um espectacular programa de televisão, de seu nome “Querido Mudei a Casa”)… e ninguém se lembra de mim?

Pela vaca: Ia ficando sem fôlego a mandar bafinhos quentes ao Menino, nas palhinhas deitado, e ele deixa que me transformem na imagem de marca de um insulto requintado ao mulherio, por esse mundo fora. Então nós não tínhamos combinado que essa coisa de eu ser sagrada era no mundo inteiro? Achas que a Índia é o mundo inteiro, carago?!! No meio de tantas escapadinhas para o templo (para dar uma de menino inteligente que percebe das escrituras e tal) deves ter faltado a umas aulas de Geografia. Deves, deves! Fosses lá agora que te recambiavam pró psicólogo com diagnóstico de hiperactividade e distúrbio de défice de atenção, só pra não te armares aos cucos!

Pelo burro: Como se não me bastasse ter tido como companheira bafejadora aquela fingida daquela vaca (que se não fosse eu, a bafejar como deve ser, o Menino ia desta pra melhor com uma hipotermia galopante) ainda tenho de levar com milénios de insultos descabidos a associar-me a acéfalos e teimosos. Menino, és um mal agradecido. E um péssimo gestor: És o filho de Deus e nem o teu emprego consegues manter? E o burro sou eu?

Pelos Reis Magos: Quilómetros a seguir uma estrela no céu, em cima de camelos duros que nem cornos (que durante dias ficámos todos com um andar novo, e nem vamos falar aqui das piadas de mau gosto que tivemos de ouvir por causa disso, mas, como éramos três… digamos que, a palavra ménage caía-nos mal) e quem é que se lembra de nós? E mais grave – quem é que disse que nós chegámos à gruta no dia 24? Hã? A ideia das prendas foi nossa e nem sequer as conseguem dar no dia certo? Nós tínhamos camelos (duros que nem cornos), não tínhamos um jacto privado (com bancos fofinhos e hospedeiras giras)! Ai taaanta dor nas cruzes e no…

E um psicólogo pro bono pra esta gente toda, não há?

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